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sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Seresta no Clube recreativo 3 Irmãos


O proprietário Garlene tem o prazer de convidar toda a população local e de localidades vizinhas, para uma animadíssima seresta com Demerval, no próximo domingo dia 25/12/11. Traga sua família para festejar o Natal no clima agradável do Clube Recreativo 3 Irmãos  

3ª Parte do texto artigo/romance do poeta/escritor João Bosco da Silva

J O Ã O  B O S C O  D A  S I L V A




* * * DE P É - C O X Ó * * *
 
Mas, o que é Viroveu?

O Viroveu tem a sua história e o seu porquê.

As terras de nossa antiga residência de inverno exauriam-se rapidamente, o que forçava a família Loura a "botar" roça nova a cada ano. A divisão geodésica em Jenipapeiro ocorrera em meados da década de 1940. João Mariano, previdente que era, já tinha em mãos os seus títulos, representados por folhas de pagamento ou formais de partilha, em seu nome e no nome de cada filho. Esperava somente a demarcação, com a abertura dos aceiros e a fixação dos limites, para registrá-los no cartório de Pascoal Santos, em Picos. Confidencialmente, seu amigo Licínio Pereira já o prevenira que a demarcação viria no início da era de 50. Seria bom que ele, meu pai, procurasse terras descansadas, de preferência de matas virgens e, se possível, longe de vizinhos, para evitar futuras arengas.

- Por ora - informava aquele chefe político (informal) - o lavrador poderia fixar-se aonde bem quisesse, desde que não criasse problemas. Depois da demarcação, isso não seria mais possível. Seu Loura, não obstante o apego ao velho sítio, resolveu seguir o conselho do líder e amigo. Assim, no verão de 1947, partiu em companhia dos filhos mais velhos para uma viagem exploratória. Em lugar ermo, isolado, mais de légua a oeste do último rancho, julgou encontrar o que procurava: terra plana, solo arenoso, de cor róseo-avermelhada, boa mata, ainda intocada. Não existia água, pelo menos em círculo de uma légua. "Tem nada não, dá-se um jeito" - ele pensou. – “Onde estamos atualmente também não havia. O rio deverá ficar a coisa de uma légua, é só abrir caminho" - concluiu. Era ali mesmo, apesar das opiniões contrárias dos filhos. Adotando como lema o provérbio popular que recomenda não deixar para amanhã o que pode fazer hoje, logo fez rancho e instalou-se provisoriamente, iniciando a ocupação. As dificuldades foram muitas, mas ele as foi vencendo uma a uma. Até a escolha do nome da nova morada tem sua história, que se resume no seguinte. Durante as semanas que ali passaram em serviço de broca, não viram outro vivente que não um pequeno pássaro de penas azuladas e canto muito triste.

- Quando essa ave rara soltava a voz, ali pelas cinco da tarde, parece que chorava - concluía seu Loura, explicando a razão do nome e revelando, assim, o sentimental que se escondia atrás de sua carranca aparentemente impenetrável.

Mané Loura, principalmente, não gostara nada daquele local. Certo dia, após ouvir o sofrido canto do solitário passarinho, aproveitou a ocasião para, assim como quem não quer nada, criticar a decisão paterna, comentando:

- Será que o bichinho está com sede?

- Este pássaro não bebe água, só vive em lugar seco - respondeu o velho, entendendo a intenção do filho em juntar mais um argumento contra a escolha daquele lugar.

- E que pássaro é este que não bebe água?

- Se chama viroveu - disse, lacônico, o velho.

- Será que nós também vamos ter de viver que nem ele? Se pelo menos fôssemos como papagaio, que tem a língua seca, mas faz zoada, em vez desse canto chorado...

Esse comentário foi bastante significativo, era a reprovação mais evidente que o filho mais velho tivera coragem de proferir. E o velho, pegando no ar os subentendidos, rebateu:

- Se não quiser me acompanhar, pode tomar seu rumo. Você é de maior, casado, e tem seus papéis na mão; portanto é dono de seu nariz. – E como remate, olhando por cima do lombo: - Isso vale para qualquer um de vocês.

Isso encerrou o assunto. Mané Loura teve de aceitar a decisão do patriarca do clã. Mesmo assim, não deixou de resmungar para os demais irmãos:

- Só que não somos viroveu. Virmos para um lugar que nem água tem pra aliviar a sede de uma pequena ave que nem essa... ?!

Já no inverno seguinte, mesmo a contragosto de Mané Loura, a mudança foi feita. E um ano depois, abriu-se caminho direto Viroveu/Ribeira e a Serra Velha foi sendo abandonada, abandonada...

Dela, hoje, nem posso imaginar o sítio.

Aí estava: V i r o v e u, nossa nova morada de inverno. Em homenagem a esse pássaro triste, que de tardezinha soltava sua voz plangente, como a envolver em nostalgia e mistério o espírito do homem cansado, mas nunca vencido.

Viroveu!

Uma invenção de meu pai? Certamente, porque não existe em qualquer dicionário, nem mesmo no livro "Aves Brasileiras", edição do MEC, qualquer registro de ave com esse nome. Talvez um dia algum estudioso da passarada consiga descobrir qual a ave com essas características e possa, então, explicar porque teria sugerido ao velho Loura nome tão singular. Possivelmente, a onomatopéia do canto:

Viro... veu; viro... veu; viro... veu ! ! !

A pequenos intervalos, três trinados de dor e nostalgia!

V i r o . . . v e u ; v i r o . . . veu; v i r o . . . veu ! ! !

O nome pegou que nem visgo. E mais do que isto: virou xodó! Tem suavidade e sugere tristeza. Mas o Viroveu só é feio e triste em tempo de seca, quando tudo seca - a terra, a mata, o ar, os bichos e... o próprio Homem!

* * *

Ai, Viroveu... Doces lembranças que me põem saudoso!

Vejo - ou revejo - meu pai, sempre aos domingos, a convidar-me a dar um passeio pelas roças. Tomava-me a mão e saíamos a fazer o périplo da verificação do crescimento do feijão, da mandioca, da melancia e das demais promessas da estação.

Quanta emoção ao, lá um dia, descobrirmos o primeiro botão, o primeiro “canivete”, a primeira vagem diminuta! Da melancia, então, descobrir a primeira vinga, nem falar!

- Cuidado! - recomendava Seu Loura.

E, então, acocorava-se ali pertinho e, quase com devoção, quedava-se a olhar aquelas primícias de sua safra com um carinho de amante. Cuidadosamente, afastava uma rama mais próxima, arrancava um matinho que lhes ficasse por perto e, daí, profetizava:

- Dentro de vinte dias, no mais tardar um mês, a gente come o primeiro cozinhado.

- E a melancia, quando a gente parte a primeira? - eu perguntava, todo interessado.

- É também por esse tempo.

E prosseguíamos viagem pelo mandiocal novo, os tenros brotos a despontar com viço da roça nova, queimada de próximo. E ele, redobrando-se em cuidados, sempre a recomendar:

- Veja por onde pisa!

Na volta, trazia o molho de maxixe pendurado no dedo, para temperar o feijão velho, ainda do ano anterior. Com muita nata ou manteiga, punha-lhe o maxixe um novo sabor. O maxixeiro não carecia de plantar; nascia à-toa e era o primeiro fruto da estação invernosa.

Ah, Viroveu ! ! !

Ai, Viroveu . . .

Como fui estulto quando, um pouco mais crescido, amaldiçoava-te por ter que trabalhar um pouco em tua seara! Amaldiçoado tu, que tanto nos deste?! Tu, messe, benesse, seara, celeiro de todos nós... A quantas gerações alimentaste?

Hoje, só posso refazer esses passeios pelas asas da saudade. Que o tempo, implacável e cruel, de ti só deixou ruínas; e ao meu bom velho, também já levou.

E assim me fico agora no frio inverno da vida (não seria outono?) a evocar lembranças, como as da primeira apanha de feijão...

Viro... veu! Viro... veu! Viro... veu!


sábado, 10 de dezembro de 2011

Crônica do escritor João Bosco em homenagem ao seu pai João Mariano (Seu Loura)

AO MEU PAI(FERRO)




Por: João Bosco da Silva



* - 07.09.1896

† - 07.12.1972

NUNCA MAIS, como antigamente, sentarás no terreiro, lado direito da porta, às 3 horas da tarde. Nunca mais, como antigamente, verás a sombra da casa alongar-se com o decorrer das horas, atingir o tronco do flamboyant, 5 metros adiante, ali pelas 5 horinhas, até fundir-se na imprecisão do lusco-fusco do cair da noite...

Tãum... tãum... tãum... tãum... tãum... tãum...

Seis badaladas mágicas, nostálgicas, compassadas, que o velho sineiro da igrejinha local, um quilômetro acima, fazia repercutir nas tardes de domingo. Atualmente aboliu-se essa prática. A voz do sino, nas ave-marias, fica apenas na lembrança dos saudosistas como eu, ou dos mais chegados na idade...

Nunca mais, como antigamente, verei meu pai, nessas tardes de folga, quedar-se contemplativo ao som daquelas seis badaladas, numa atitude de beatífico respeito, recolhimento e místico temor.

Nunca mais, como antigamente, verei esse quadro tão singelo. Aqui já só parece existir o antigamente. Porque tudo já é decadência, abandono e desolação. Meu pai já não está mais aqui; a casa já não pertence à família Loura. O alto em frente encheu-se de vassourinhas e o flamboyant, galhos retorcidos de angústia e saudade, já não flora mais.

Flamboyant, velho amigo! Continuas aí, já não tão firme como antigamente, mais solitário e com ar de quem chora a prolongada e definitiva ausência de entes tão queridos! Outrora, esconderijo de tanto menino gárrulo - filhos, netos, bisnetos - sob tuas ramagens verdes (eu, inseto a devorar tuas flores rubras), quanta conversa tivemos! Agora, aí isolado, desolado, descuidado - de todos esquecido... Agora, ninguém mais te procura, dia claro ou noite escura, quem sabe de ti? Hoje, nem mesmo ocasional viandante te acena, amistoso. O caminho que levava a ti, acabou-se; a casa, cuja frente adornavas, está a ruir... * E o dono da casa?

Foi passear no céu, em outros Viroveus...

A d e u s ! ! !

* * *

Na casa... velha casa... ninguém mais vive. Não se ouve mais um som de nada. Essa saudade silenciosa e surda não produz som e está muito distante. As árvores... velhas árvores... de em volta - o pereiro-preto; o trapiá de meu pai; o jatobá-de-porco; o jenipapeiro (este bem mais novo); o pé de juá (cortado para servir de ração para o gado na grande seca de 1958) - sumiram todas. Oh, breve transitoriedade das coisas... Eternidade tão breve! Quantos anos? 10, 20, 30?

Que sei eu...

Foste aquele pau-ferro da frente lá de casa - frondoso e firme, e de muitos galhos. Um dia, fogo de seca - 1 9 5 8 - da velha árvore tão forte só o tronco restou.

Hoje, retornando após tantos anos, nem o velho tronco chamuscado, nem tu, meu pai, sempre de filhos e netos rodeado!

O velho pau-ferro, que nos viu nascer, tombou pelo fogo da seca. O velho pai-ferro, que nos fez viver, tombou pelo fogo de tanta vida. Tiveste, meu velho, uma vida plena. Velho Loura, bondoso, justo e amigo, da vida te foste, mas deixaste o exemplo. Só que nenhum de nós consegue exercitar, como tu, as tuas raras virtudes: probidade, trabalho e amor!

Meu bom e querido velho Loura! Conforme a gente conversava, fui o herdeiro de tua velha casa e do teu velho Alto do Trapiá. Mas as vicissitudes da vida me obrigaram a desembaraçar-me de tão preciosos bens. Foi para servir teu filho José, em momento de apertura financeira, que deles me desfiz. Seria uma atitude bem tua: Servir os teus filhos, tudo fazer por eles. Por todos nós.

De onde estiveres, manda-nos as tuas bênçãos.

* * *

A MORTE DE SEU LOURA decretou o fim do seu clã. Os filhos, desnorteados, não encontraram entre si liderança a altura de orientá-los e dirigi-los. Mas a vida havia de continuar. E era preciso vivê-la. E veio a dispersão final.

Maria, mãe de Evangelista, foi o primeiro desfalque: faleceu em 1945. Em 1972 - época do óbito do patriarca - já moravam fora: em São Paulo, Teresa (falecida); Em Picos, Geralda e Camila; em Teresina, Mariano e Céu (falecidos) e eu. Após a morte de nosso pai, arribaram para Araguaína: Mané Loura e Bió (falecidos) e José. Como única e última representante direta, apenas Sança continuaria morando em Francisco Santos, até falecer em 14 de junho de 1984.

João Mariano da Silva!

Do teu grande time, restamos vivos: Geralda, José, Camila e eu.

A nós, que ainda cá estamos, mesmo sem a sombra do teu manto protetor, resta a obrigação de honrar o teu nome e homenagear a tua memória – querido velho!

E os netos? E os bisnetos? Há-os espalhados neste imenso território de brasis, tentando levar a vida. Alguns nem se lembram mais, e outros nem sabem, que um dia existiu um bom velho chamado... Seu Loura.

E m J e n i p a p e i r o ,

hoje Francisco Santos.

Onde fica isso? – perguntarão.

. . . ? ? ?

* Esta crônica foi escrita quando o flamboyant e a casa ainda exisitiam. Agora, nem a árvore amiga, tampouco a casa que me viu nascer.



terça-feira, 29 de novembro de 2011

2ª Parte do texto artigo/romance do poeta/escritor João Bosco da Silva

J O Ã O   B O S C O   D A  S I L V A







* * * DE P É - C O X Ó * * *


Eis-me lá - ou aqui? Aqui, no topo dos meus cinqüenta anos. Meio século de vida. A que medida - digamos, de comprimento - equivaleriam esses cinqüenta anos? A cinqüenta centímetros? Por que não a metros ou quilômetros? Essas medidas todas terminam em metros e são, contudo, bem diferentes, embora extensões da mesma medida.

Não poderiam ser léguas?
Mas que besteira, que mais tola comparação? - eu mesmo me digo, como a criticar a pena escorregadia e frívola. Ora, pois... querer medir a vida em termos de metros, léguas... como se a vida fosse um caminho! Tolice.
Pensando bem... esse meu juízo hoje está solto... Pensando bem, a vida bem que poderia ser comparada, em vez de ser medida. Que guarda alguma semelhança com um caminho, isso guarda. Pois não é que se costuma dizer: "A vida e seus caminhos”? Aliás, havia um programa de rádio com esse nome. Daí, pensar nos caminhos de minha infância, nos caminhos de minha terra, caminhos pelos quais palmilhei em jornadas de suor e sede, tocando jumentos carregados de pesadas cargas. Carregando paul, carregando mandioca, carregando feijão... Caminhos que hoje nem existem mais, como aquele da maniçoba, lá do outro lado, passando pela Unha de Gato. Caminho de poeira e medo aquele. Medo de cobra, de cachorro doido... E então lembro que Juli, ótimo cão de caça, "correu" fazia uma semana. Como eu brincava muito com ele, isso me dá um arrepio... Medo de vaca parida pegadeira. Mesmo sem ver nenhuma, o simples toque de um chocalho já me punha eriçado, nervoso. Ih! medo do caipora. Só voltava pra casa com a tora de fumo no bolso, para presenteá-lo, caso aparecesse, "que Deus me livre e guarde". E de onça? Virgem Maria! Diziam ter muita onça lá pela maniçoba. Meu pai, nas quentes bocas-de-noite, costumava ouvir-lhes os esturros e sentir-lhes o bafo podre, de tão perto que vinham do rancho. De manhãzinha, ao recolher a borracha extraída no dia anterior, lá estava o piseiro delas, debaixo das leitosas maniçobeiras.
Caminho da maniçoba! A ida era no domingo à tarde: papai, Zé, Bió e Mané Loura - a família Loura inteira - para o serviço de extração da borracha, que naquele tempo ainda dava dinheiro. Eu era levado para trazer de volta os animais, na segunda-feira cedinho. Lá não havia pasto nem água para os animais. Levada em cabaças, era regrada, mal chegando para beberem e cozinharem a bóia. Seu Loura me despachava ainda com escuro, para que eu chegasse com tempo de ir para a escola. Novamente na sexta-feira à tarde, voltava lá com os animais, para buscar os seringueiros e a produção da semana.
Como fedia a borracha, pegadiça e mal-cheirosa! E os trabalhadores, uma semana sem banho?
Pois é, esse caminho não existe mais. Só a trilha em minhas tênues lembranças, e a lega com que meu pai feria a polpuda casca da árvore para lhe extrair o leite. Aliás, nem a lega, que lhe guardei com carinho. Comeram-lhe o cabo de madeira o cupim; a alça de arame chato, a ferrugem.
Numa dessas viagens, peguei uma coça das brabas. Seu Loura não era de andar surrando a toda hora, mas quando pegava, pegava pra valer, descontando novas e velhas dívidas. Nesse dia.. (que dia? Sei lá, um dia qualquer), simplesmente me recusava ir a viagem. Escondera-me no galho mais alto do pé-de-trapiá de tia Dona. Mesmo socado entre a folhagem, o velho me achou. Até aí, tudo bem, não fora a rezinga, a azucrinação, toda hora falando que não queria ir. Ia indo, mas birrando: "Não vou, não vou". Não houve outro jeito. Já na subida do Barrocão, a mais de dois quilômetros de casa, o velho não agüentou mais o renrenrém. Com o cipó de bananinha, já todo descascado de tanto surrar os jegues, abrochou-me cinco cipoadas com toda a força do braço.
Um colega que passava no momento, presenciou a cena. No dia seguinte, na escola, foi aquela gozação. O gaiato espalhara a notícia, e só se falava na sova.
“Era o cipó descendo no lombo do cabra e o mijo escorrendo na perna” - troçava o gaiato. E todos o acompanhavam na gargalhada.
Pois é...
Guarda ou não guarda a vida alguma semelhança com um caminho? Acho que sim, e ponho-me a pensar nela - na vida, na minha vida - como se fora um caminho, com todos os seus acidentes de percurso... esse caminho que vim palmilhando e agora busco repercorrer nestas inefáveis evocações...
* * *
Como se fosse uma visão. Esgazeada, rápida. Mas uma visão. Tudo voltando, tudo. O céu, azul; brancas as nuvens. Verde a floresta. Cheiro de terra molhada. Impressão de fartura. Gordo! Grande! Belo! Bom!
Flutuo...
Uma visão, apenas. Ligeira, como num sonho que nem sei quando começa. Quando me dou conta, já estou sonhando. Ás vezes também não sei quando ele acaba. Tão etéreo, imaterial... Um sonho de que só recordo pedaços, trechos entrecortados. Ás vezes nem sei se estou dormindo ou acordado. Quando acordo e me dou conta da realidade, é que descubro que estava sonhando. Ah! o sonho... intangível, impalpável - tão bom!
Uma visão, apenas. De névoa. Fugindo, rápida. Rápida como aqueles flocos. Eu criança, então. E corria atrás deles, se corria! Lembro-me bem. Quando achava que ia alcançá-los, dissolviam-se. Ou então... eu acordava.
Era no Viroveu...
E como me lembro!
O Viroveu, hoje, corre como aqueles flocos...
A névoa correndo em flocos, numa fria manhã. Eu, correndo atrás. Corríamos ambos. Para o norte, para além da casa de Mané Loura. Mané Loura e sua casa já nem existem mais. Corriam para além da roça "de dentro", que ficava para o norte. Só que eu não sabia o que era o norte. Hoje eu sei que "pra dentro", como nós dizíamos, era o norte. Naquele dia os flocos corriam "pra dentro" e não "pra baixo", como era de se esperar. Isto é, para o poente, levados pelo vento. "Pra dentro" era a floresta, léguas de solidão desabitada. Andando-se "pra dentro" ia-se dar nos Gerais, às terras de ausentes.
- Não, não - dizia meu pai, explicando a história das demarcações - cinco léguas adiante, nas extremas dos Vuegas, Pedrosa teve de parar a demarcação das terras da Fazenda Jenipapeiro. Houve reclamação de antigas posses. Antônio das “Negas”, ricaço latifundiário do município de Pio IX, apresentou documentos, coisa antiga, mas que a Lei considerou.
Era o norte o "pra dentro" de minha infância, que agora, vez por outra, relembrava em sonho. Ou nesse evocativo sonho de olhos abertos. Lugar de muita onça. De muita caça também. Diziam, que eu mesmo nunca que estive lá.
Lembro muito bem das caçadas de mel de abelha. Dessas, participei. Dia de azar, vínhamos voltando de cabaças vazias. Eu, correndo à frente, fui averiguar uma umburana frondosa à beira do caminho. Lá estava, quase rente ao chão, o canudinho da boca, o entra-e-sai de abelhas. Alegria da vida! Gritei, eufórico:
- Achei um, achei um!
Meio desconfiados, sem quererem acreditar, vieram chegando os caçadores. Meu pai, como chefe da caçada, aproximou-se e confirmou:
- Munduri, arranchado de véi.
Enorme alegria! Fui o herói da tarde, o "salvador da pátria". Encheram-se as cabaças. Pois bem, dessas caçadas participei. Mas não eram na região das onças, não. Eram bem mais "pra fora", perto da casa e do rio.
- Tem perigo não - costumava dizer Seu Loura a propósito das bichanas - que onça tem medo de gente. Onça só ataca se estiver com fome. Ou pra se defender. Mesmo isto aqui tá muito pisado.
- Pois sim, vão confiando nisto - aparteou Zé de Loura, contradizendo-o.
- Quem não se alembra da história de Chico Romualdo? - atalhou Bió, entrando na conversa. - Ele se cagou de medo de um bode, pensando que era uma onça preta. Só quando o bicho berrou e saiu peidando, e vendo o par de chifres, foi que se deu conta do engano. Mas aí o "mel" já descia na perna.
E por aí foi a conversa se desenvolvendo, com histórias e mais histórias de caçador, "a nação de gente mais mentirosa que eu já conheci", segundo dizia Seu Loura, enquanto a caravana ia furando caminho na picada estreita e cipoenta.
Eu, não vou mentir, tinha muito medo de onça. Se tinha? Era assombrado, me pelava. Se até no Viroveu se tinha notícia de onça... isto é, de rastro, que ver mesmo ninguém nunca que viu. Quanto mais duas ou três léguas no "pra dentro" brabo das bichanas! E cobra? Que dizer das cobras? Destas até meu pai, que era destemido, tinha medo.
- Cobra? É aparecer, e cacete nela! - recomendava, aproveitando a oportunidade para relatar um acontecido no rancho dos Feitosas dos Inhamuns, gente danada de valente. Contava que certa feita, viajando "por terra" para vender alho, pedira rancho a seu Tonico Feitosa, fazendeiro de muita terra e gado no Parambu, extremando com Tauá. De manhãzinha, já cargas em cima, ele vê a rodilha: jibóia desconforme. Não conta conversa. Pega uma vara e... zás! Mata-a e, em seguida, vai depositar a defunta num barranco, longe da casa. Ao retornar, a criada pegunta-lhe se não viu uma cobra “assim e assado”. Só aí ele se dá conta de que o asqueroso animal era de estimação. Vai ao dono da fazenda e confessa seu malfeito, não sem antes deixar claro qual era o costume de sua terra:
- Em minha terra se cria cobra é no cacete, seu Tonico. O senhor me desculpe, e me diga quanto lhe devo.
A essa confissão, diz-lhe o senhorio:
- Vejo que o senhor é um homem de bem; salvou-se pela sua honestidade. Pois se não me tem dado conta do malfeito, meus cabras haveriam de persegui-lo até o fim do mundo e suas contas seriam ajustadas com o Senhor lá de cima. A cobra era de estimação e não tem preço; pelo seu gesto em me contar, está desculpado. Mas dou-lhe um conselho: “Que doravante, para o seu próprio bem, é bom observar o provérbio que diz: ‘Cada povo com seu uso; cada roca com seu fuso’. Evitará aborrecimentos futuros, seu João Mariano" - recomenda o rancheiro, concluindo sua admoestação.
O velho Loura, com essa, deu muito obrigado, azeitou os mocotós, e: "Pernas? Para que as quero?".
Pois bem, cobra ele só deixava vivas as de nossa casa no Alto do Trapiá, as inofensivas “corredeiras” ou papa-pintos, que só faziam mal aos "rabos-de-couro", como ele mesmo dizia. Mas o que dizer das cascavéis e jararacas? Felizmente, as primeiras eram raras; e as últimas, menos letais. Quantas vezes, na capina de uma moita, não vinham pedaços de cobra, cortada a gume de enxada!? Por isso, chiou no mato, cabelo em pé, sentidos em alerta, cacete na mão, esperava a peçonhenta e - pimba!
E de onça? Ave Maria! Eu, hein? Havia até a história de uma onça preta que atacou João Bandu... Bem, mas isso é outra história. Passou-se na Santa Helena de Odilon Sacerdote e de Osvaldo, do outro lado do rio.
O fato é que eu, desde menino, muito admirava os homens destemidos como meu pai. Ele ia, sozinho, buscar estacas e varas no Morro das Caboclas ou queimar macambira na Baixa da Pedra, distante quatro a cinco léguas, já quase nos Gerais. Ás vezes me levava com ele.
- Se não puder ser de outra valia - costumava dizer, quando eu reclamava - servirá pra sustentar o costal na hora de pôr a carga arriba; e se nem pra isso se prestar, pelo menos de companhia servirá. Há sempre a possibilidade de um acidente, de um imprevisto, e na hora do "afragelo" você poderá ser de alguma ajuda.
Lembrava, então, que se o finado Caetano, morto de ataque do coração na dita Baixa da Pedra, não estivesse acompanhado do garoto Samuel de Quincó de Barros, talvez tivesse sido devorado pelos urubus ou pelas onças.
- Foi o menino que veio avisar os parentes na Ribeira - concluía o velho, deixando bem clara a necessidade de me levar.
E lá íamos nós. Nessas ocasiões, como eu rezava! De puro pavor.
À noite, dormindo no meio da mata, ao relento, o simples estalar de um graveto me fazia mijar de medo (ou coisa pior). Seria o caipora, que sempre pedia fumo a gente? Seria onça? Que marmota seria? Poderiam ser mil e uma assombrações, eu concluía, com (in)justificável pavor. O velho, entretanto, mal atava a rede, punha-se a roncar e eu ficava acordado, tremendo, mil vozes ouvindo, reais ou imaginárias. Consolava-me a presença dos jegues ali pertinho, os quais, também como o gado, eram inspiradores de paz e coragem. Numa dessas viagens, ele decidiu pernoitar no Viroveu, numa espécie de escala. De madrugadinha, retomaríamos o caminho em busca das cargas de estaca. As serras estavam desertas, porque era no mês de agosto e todo mundo já havia descido para suas casas na Ribeira, após as farinhadas. Na tentativa de minorar o medo, armei minha rede quase apegada na dele. Lá pelas tantas, não sei bem se estava dormindo ou acordado, escutei-o dizer:
- João Bosco, você fica aí que eu vou ver se pego um tatu lá na roça de Mané Elias. O bicho tá comendo na macaxeira.
E partiu em seguida.
Fiquei só e então comecei a tremer de medo. Não tendo para quem apelar, pus-me a rezar a jaculatória que me haviam ensinado para as horas de aflição: "Meu anjo da guarda, meu bom guardador, guardai minh'alma pra Nosso Senhor". A oração não fez efeito. Ao contrário, fez aumentar o medo ainda mais. Na espera sem fim, o medo se decuplicou. Os motivos são uma realidade inegável. Ali estão os estalidos de uma rama, as mil vozes da noite, os mil bichos da floresta, os esturros de onça, os latidos de cachorro doido, e - objeto maior de meu pavor - as almas.
Não suportando mais tanta aflição, já me borrando, levantei-me decidido a ir procurar meu pai no local da caçada, situado quilômetro e meio abaixo. Saí, a princípio, devagar; depois, a trote e, finalmente, em desabalada carreira. A meio caminho, bem debaixo do esgalhudo, velho caneleiro frondoso derreado sobre o caminho, um pau espetou meu pé, de onde o sangue começou a jorrar forte e quente.
Com a dor física, tomei plena consciência da situação. “Que estava fazendo ali? Por que viera parar debaixo do esgalhudo?” Então, lembrei-me do motivo: saíra em busca de meu pai. Mas seria verdade ou teria sido sonho a história da caça ao tatu? - fiquei me perguntando.
Parado ali, no meio do caminho, percebi o olho mágico da lua a me espiar de través por entre a fresta de um galho. Para cúmulo do azar, uma ave noturna, incomodada no seu repouso, soltou um piado agudo e agourento bem perto de mim.
Antes de decidir o que fazer, desmaiei.
O velho Loura, após dar por minha falta na rede, pôs-se a virar e a revirar meio mundo, até conseguir tomar o meu rastro ao amanhecer. Encontrou-me desfalecido e frio. Por um momento, supôs que eu estivesse morto...
Este, ao que me lembre, foi o meu único ataque de sonambulismo.
Graças a Deus.




segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Francisco Santos Realiza a 1ª SAPCA: (I Semana de Ação e Proteção as Crianças e Adolescentes, do dia 10 a 15/11/2011)

Com o bjetivo de integrar crianças, adolescentes e toda a comunidade na busca de conhecimentos e práticas saudáveis (saúde, diversão e lazer) rumo a obtenção de uma sociaedade mais humanitária e consciente das suas atitudes e ações é que a administração municipal de Francisco Santos realizou do dia 10 ao dia 15 de novembro de 2011 a I - SAPCA: I Semana de Ação e Proteção as Crianças e Adolescentes.

DIVULGAÇÃO


ABERTURA









PASSEATA




I SEMINÁRIO DAS PROFISSÕES. ORG. SME (Educação)







 Proteção Social as Crianças e aos Adolescentes: 14/11/11 Org. SMS (Saúde)





Descobrindo Talentos: 14/11/11 à Noite Org. SEMAS (Sec Mun. de Assistência Social) 












Campeonato de Futsal: 15/11/11 Org. SME (Esporte)






domingo, 20 de novembro de 2011

A Secretaria Municipal de Assistência Social de Francisco Santos, Promove "Descobrindo Talentos" no dia 14 de novembro de 2011.

A Secretaria Municipal de Assistência Social, realiza aos 14 dias do mês de novembro "Descobrindo Talentos", uma noite dedicada ao conhecimento e apreciação dos talentos da nossa terra.
Na ocasião que faz parte da I Semana de Ação e Proteção a Criança e o Adolescente, jovens e crianças apresentaram seus talentos e foram aplaudidos por toda a população municipal. As crianças do PETI fizeram a apresentação e abertura com seu grupo de dança, logo em seguida para a abertura dos talentos na musica, Carlos Heitor e Joniley mostraram o seu talento e em seguida foi apresentado os novos talentos na musica. Para a abertura dos talentos na passarela Criste Helen e Bianca Jaqueline, duas modelos consagradas. Para a abertura do talento na na poesia, Joaquim Neto e na dança o grupo de dança da Monteiro Lobato.
Dando continidade ao evento foram apresentados os talentos na música, Nícolas, na poesia Cleovan, na moda Tassia, Letícia, Edichirley e Mariana e na dança Arquimedes, grupo de dança independente e da dança da boneca do Km 87.
Levando-se em consideração a importância da realização deste evento para as crianças e adolescentes, podemos constatar que pela participação dos jovens e da população como um todo, o evento realizado pela SEMAS, enaltece e enriquece os dons e talentos da nossa terra.